miércoles, abril 23, 2014

Arundhati Roy, una renegada

A renegada - PÚBLICO



"Sempre me irritou um bocado que as pessoas dissessem: ‘Você não voltou a escrever’, como se a não ficção que eu escrevi não fosse escrita”, diz Arundhati Roy.
Estávamos em Julho, sentados na sua sala de estar de Roy, com as janelas fechadas para proteger do calor do Verão de Deli. Deli pode estar a sofrer com a queda na economia, o aumento dos crimes contra as mulheres e com as eleições que se aproximam, mas tudo está em sossego em Jor Bagh, uma zona residencial de classe alta ao lado do parque Lodhi Gardens, com os seus túmulos do século XVI. Filthy, o cão rafeiro de Roy, dorme no chão, com a barriga a descer e a subir sincopadamente. O canto melancólico de um pássaro irrompe pelo ar. “É um calau”, afirma Roy, com a expressão de quem está a pensar no assunto.
Roy, mais conhecida talvez pelo O Deus das Pequenas Coisas, o seu romance sobre relações que rompem com as barreiras de casta, classe e religião, levando a assassínios e acabando em incesto, só há pouco tempo se voltou novamente para a ficção. É outro romance, mas por enquanto o tema é segredo. Está ainda a tentar livrar-se do papel de activista e intelectual que tem desempenhado nas duas últimas décadas. E fala, ainda que com alguma relutância, do seu “último compromisso”. É mais ousado do que os seus ataques à ocupação indiana de Caxemira, às guerras americanas no Iraque e no Afeganistão ou ao capitalismo de compadrio. Desta vez, ela virou-se contra Mahatma Gandhi.
Uma pequena editora indiana, a Navayana, pediu-lhe que escrevesse um prefácio para a nova edição de The Annihilation of Caste. Escrito em 1936 por B.R. Ambedkar, o líder progressista que escreveu a Constituição indiana e que se converteu ao budismo, o ensaio é talvez o mais famoso ataque da era moderna ao sistema de castas da Índia. Inclui uma crítica a Gandhi que quis abolir os intocáveis, mas não as castas. Ambedkar considerava todo o sistema de castas moralmente errado e não democrático. Ao ler a troca de argumentos entre Ambedkar e Gandhi, Roy foi ficando cada vez mais perturbada com a posição de Gandhi, que acha retrógada.

A pequena introdução foi crescendo na sua cabeça, “até se tornar quase um livro”. Não procurou tornar-se branda no que dizia respeito a Gandhi e por isso muito provavelmente iria provocar polémica. Até Ambedkar passou um mau bocado. As suas posições eram consideradas de tal forma provocadoras que foi obrigado a fazer uma edição de autor. Quanto mais ela falava do assunto, mais complicado este assunto se tornava.
Roy levou-me para a sala do lado, onde livros e jornais estão espalhados pela mesa de cozinha que faz de secretária. Os escritos coligidos de Ambedkar e Gandhi, volumosos e em combate uns com os outros, estão empilhados numa torre, com marcas entre as páginas. O caderno onde anotou os seus pensamentos numa letra pequena e precisa, está aberto em cima da mesa: um intermediário frágil num debate quase centenário entre gigantes.
Quando publicou 'O deus das pequenas coisas', em 1997 PAUL HACKETT/REUTERS
“Tive chatices no passado por causa da minha não ficção”, diz. “Jurei: ‘Nunca mais volto a escrever nada com notas de rodapé’.” É uma promessa que não tem conseguido manter. “Há meses que ando a reunir pensamentos, lutando com perguntas, chocada com o que tenho lido”, afirma quando lhe pergunto se já começou o ensaio. “Sei que quando for publicado, muita coisa vai acontecer. Mas é uma coisa que eu preciso de fazer.”
Quando estava na casa dos 30, Roy tornou-se talvez a mais famosa escritora da Índia. A publicação de O Deus das Pequenas Coisas em 1997 coincidiu com o 50.º aniversário da independência da Índia. Foi o início de uma fase agressivamente nacionalista e consumista e Roy foi vista como a representante da [campanha para atrair investimento] Brand India. O romance, o seu primeiro, apareceu na lista de best-sellers do New York Times e venceu o Booker Prize. Vendeu mais de seis milhões de cópias. Os tablóides britânicos publicaram perfis confusos (“um livro de 500 quilos da fábrica de pickles intocável”) e as revistas fotografaram-na — com os seus cabelos a cair em cascata e as suas maçãs do rosto salientes — à frente dos riachos e da folhagem densa de Kerala, onde o romance se passa e que tinha acabado de se tornar um destino turístico.
De ícone a crítica impiedosa
A imagem de Roy como ícone nacional chegou abruptamente ao fim um ano depois, quando o Governo do partido de extrema-direita hindu Bharatiya Janata Party (BJP) conduziu uma série de testes nucleares. Estes foram amplamente aplaudidos pelos indianos que se identificavam com o nacionalismo hindu, muitos deles membros de uma classe média ascendente. No ensaio intitulado The End of Imagination (O fim da imaginação), Roy acusou os apoiantes dos testes de se deixarem inebriar com as demonstrações de poder militar — enveredando pelo belicismo que levou o BJP ao poder pela segunda vez desde a independência —, em vez de se preocuparem com as condições deploráveis nas quais a maioria dos indianos vivia. Publicado em simultâneo pelas revistas anglófonas Outlook Frontline, o ensaio marcou o seu início de escritora abertamente politizada.
A viragem política de Roy enfureceu muito do seu público de casta alta, urbano, anglófono, ainda que tenha atraído outro. A maior parte dos seus novos fãs nunca tinham ouvido falar no romance, falavam frequentemente outras línguas que não o inglês e sentiam-se marginalizados devido à sua religião, casta ou etnia; sentiam-se deixados para trás pelo crescimento económico da Índia. Devoravam os ensaios que começou a escrever, distribuídos com traduções não autorizadas, e juntavam-se em comícios para a ouvir falar. “Havia todo aquele ressentimento, muito compreensível, com O Deus das Pequenas Coisas, por haver uma pessoa a escrever em inglês e a ganhar imenso dinheiro”, comenta. “Por isso, quando saiu o The end of Imagination deu-se o reverso, uma fúria entre as pessoas anglófonas, mas também um acolhimento por todos os outros.”
A veemência da resposta surpreendeu-a. “Não há nada no ‘Deus das Pequenas Coisas que choque politicamente com o que eu viria a escrever nos 15 anos seguintes”, afirma. “É um campo instintivo.” É verdade que o livro também explorava questões de justiça social. Mas sem a armadura de personagens e enredo, os seus ensaios pareciam didácticos — ou simplesmente errados — aos olhos dos seus detractores, golpes fáceis numa Índia cheia de energia e objectivos. Mesmo aqueles que simpatizavam com as suas posições suspeitavam da sua celebridade e consideravam-na diletante. Mas ficar à margem não era uma opção. “Se eu não tivesse dito nada sobre os testes nucleares, seria como estar a celebrá-los”, afirma. “Eu estava sempre nas capas de todas aquelas revistas. Não dizer nada tornara-se tão político como dizer alguma coisa.”

Virou-se a seguir para as megabarragens que iam ser construídas no rio Narmada. Os habitantes que provavelmente teriam de ser transferidos andavam a fazer manifestações, mesmo depois de o Tribunal Supremo ter autorizado a construção. Viajou pela região, juntando-se aos protestos e criticando a decisão judicial. Em 2001, um grupo de homens acusou-a e a outros activistas de os terem atacado numa manifestação à porta do Supremo. Roy apresentou uma petição para que as queixas fossem retiradas. O tribunal concordou mas achou a linguagem do seu requerimento tão ofensiva (acusou o tribunal de tentar “esquartejar a crítica, atacar e intimidar os que discordam de si”) que a prendeu. “Mostrando a magnanimidade da lei tendo em conta que a arguida é uma mulher”, dizia a sentença, “e esperando que no futuro mais bom senso e sensatez sirvam a causa da arte e da literatura”, Roy é condenada a “um dia de detenção simples” e a uma multa de duas mil rupias.
O documentário da BBC Dam/Age captou parte do drama que rodeou a sua detenção na prisão tipo fortaleza de Tihar. Quando apareceu no dia seguinte, a sua transformação de ícone da Índia a crítica severa do país estava completa. O cabelo, que agora usava bem curto, evocava desconfortavelmente uma mulher ostracizada e uma feminista determinada. Os media de língua inglesa ridicularizaram-na por criticar as barragens, que viam como mais uma prova do crescimento indiano. Os seus trabalhos subsequentes foram também alvo de ataques: as suas denúncias angustiadas ao massacre de muçulmanos no Gujarat em 2002; os planos para a extracção de bauxite em Orissa (agora Odisha) por uma empresa sediada em Londres chamada Vedanta Resources, as operações paramilitares no Centro da Índia contra as populações tribais indígenas e os guerrilheiros de extrema-esquerda [de inspiração maoista] chamados naxalitas; e a presença militar indiana em Caxemira, onde mais de meio milhão de soldados controlam a maioria da população muçulmana que quer a separação da Índia.
Caxemira, território pelo qual a Índia travou três das suas quatro guerras contra o Paquistão, iria tornar-se um dos seus temas centrais. Em 2010, depois de uma série de grandes manifestações durante as quais rapazes adolescentes enfrentavam soldados, comentou publicamente que “Caxemira nunca foi parte integrante da Índia”. Ao sugerir que o Estado indiano era uma mera construção, um produto da partição como o Paquistão, ela estava a ultrapassar uma linha. Nem mesmo os mais progressistas na Índia tinham ido tão longe. Rapidamente se viu no centro de uma tempestade nacional. Uma multidão com pedras, seguida por carrinhas de televisão, apareceu à frente de sua casa. O canal conservador de televisão Times Now emitiu imagens em câmara lenta da sua visita de Roy a Caxemira, durante a qual ela parecia estar a andar numa passerelle, sem responder às perguntas dos jornalistas. De volta a Deli, o Times Now reuniu um painel moderado pelo seu apresentador tremendamente popular, Arnab Goswami, para discutir — entre títulos e notícias em que “raiva” e “Arundhati” eram as palavras mais comuns — se Roy deveria ser presa por instigação à revolta. Quando o único membro muçulmano do painel, Hameeda Nayeem, referiu que Roy não tinha dito nada que a maioria dos caxemires não pensasse, o seu discurso foi interrompido por Goswami. Foram apresentados processos contra Roy em tribunais de Bangalore e Chandigarh, acusando-a de ser “antinacionalista”, “anti-humana” e supostamente de ter escrito num dos seus ensaios que “Caxemira deveria ser libertada dos indianos nus e esfomeados”.
Arundhati Roy em sua casa, em Deli, em 2007 STUART FREEDMAN/CORBIS
Lutas de classes
O apartamento onde me encontrei com Roy em Julho ocupa o último andar de um prédio de três pisos e tem todos os atributos de uma casa de classe alta — um relvado à volta, uma grade elevada e um pequeno elevador. Há poucos sinais do seu estatuto dissidente: os autocolantes na porta (“nos dias que correm temos de ser muito cuidadosos porque…”); os livros na sala de estar (Howard Zinn, Noam Chomsky, Eduardo Galeano); e, particularmente invulgar no contexto indiano, a ausência de empregados (Roy vive totalmente sozinha). Talvez o mais revelador seja a forma como Roy veio parar a esta casa, pela qual ela passava todos os dias a caminho do trabalho, numa bicicleta que alugava por uma rupia.
Roy nasceu Suzanna Arundhati Roy em 1959 em Shillong, uma pequena cidade montanhosa na extremidade Nordeste da Índia. A sua mãe, Mary, era de uma comunidade fechada de cristãos sírios em Kerala. O pai, Rajib, era um hindu bengali de Calcutá, gerente de uma plantação de chá perto de Shillong e um alcoólico. O casamento não durou muito, e quando Roy fez dois anos, ela e o irmão, Lalith, um ano e meio mais velho, voltaram para Kerala com a mãe. Depois de terem sido mal recebidos pela família, mudaram-se para uma quinta do avô materno de Roy em Ooty, no estado vizinho de Tamil Nadu.
“Depois houve imensas histórias horríveis”, diz Roy, começando a rir. “A minha mãe ficou muito doente, uma asma grave. Achámos que ela estava a morrer. Ela mandava-nos à cidade com um cesto, os merceeiros punham comida no cesto, na maior parte das vezes apenas arroz e pimentos verdes.” A família ficou lá até Roy fazer cinco anos, desafiando as tentativas da avó e do tio de os expulsar de casa (as leis de heranças entre os cristãos sírios beneficiam fortemente os filhos rapazes). A mãe de Roy acabou por se mudar para Kerala e começar uma escola seguindo as premissas do Rotary Club local.

Como filha de mãe solteira, não estava confortável na comunidade conservadora de cristãos sírios. Sentia-se mais em casa nas chamadas castas baixas, ou dálitas, que eram mantidos à distância tanto por cristãos como por hindus de castas mais altas.
“Muito daquilo que penso veio por mim”, diz ela. “Ninguém me prestava atenção suficiente para me doutrinar.” Quando foi enviada para a Lawrence, uma escola fundada por um oficial britânico (o lema: “Nunca desistir”), talvez já fosse tarde demais para a doutrinação. Roy, então com dez anos, diz que a única coisa de que se lembra da Lawrence foi ter-se tornado obcecada com a corrida. O irmão, que gere um negócio de exportação de marisco em Kerala, tem outras memórias do seu tempo ali. “Quando ela estava na preparatória, era bastante popular entre os rapazes mais velhos”, contou-me a rir. “Era também perfeita e tremenda nos debates.”
Roy reconhece que a escola teve a sua utilidade. “Tornou mais fácil a evasão, quando a fiz.” Como filha de um casamento disfuncional e de um divórcio ainda mais vergonhoso, era esperado que Roy fosse mais modesta nas suas ambições. As suas perspectivas de futuro melhoraram com o primeiro liceu que frequentou; era dirigido por freiras e dava treino de secretariado. Mas em vez disso, aos 16 anos, mudou-se para Deli para estudar na Escola de Planeamento e Arquitectura.
Escolheu Arquitectura porque lhe permitia começar a ganhar dinheiro no seu segundo ano, mas também por idealismo. Em Kerala, conheceu o arquitecto britânico nascido na Índia Laurie Baker, conhecido pelos seus edifícios sustentáveis e de baixo custo, e foi tomada pela ideia de fazer um trabalho semelhante. Mas rapidamente percebeu que não iria aprender essas coisas na escola. “Eles queriam que fôssemos empreiteiros”, diz ainda indignada. Ela lutava com perguntas para as quais os professores não pareciam ter repostas: “Qual é o seu sentido estético? Para quem projecta? Mesmo que estejamos a projectar uma casa, qual é a relação entre homem e mulher que o projecto assume? A coisa foi-se tornando cada vez maior. Como estão organizadas as cidades? Para quem são as leis? Quem é considerado cidadão? No final, isto tinha afunilado numa coisa muito política.”
No seu projecto final,  recusou-se a desenhar um edifício e em vez disso escreveu uma tese, Desenvolvimento Urbano Pós-colonial em Deli. “Eu disse-lhes: ‘Agora quero falar-vos sobre o que aprendi aqui. Não quero que sejam vocês a dizer-me o que foi que eu aprendi aqui’.” Roy sentia-se apoiada pela contracultura que existia entre os seus colegas, que mais tarde representaria no filme In Which Annie Gives It Those Ones (de 1989). Ela escreveu, projectou e actuou nele — uma figura minúscula com um negro gigante a desempenhar o papel de Radha, que desiste da Arquitectura para se tornar escritora, mas que morre afogada antes de acabar o primeiro romance.
Roy escreveu e actuou em 'In Which Annie Gives It Those Ones', de 1989
Por esta altura, já tinha rompido o contacto com a família. Sem dinheiro para ficar na residência de estudantes, mudou-se para um bairro de lata com o seu namorado, Gerard da Cunha. (Fingiram que eram casados para respeitar os padrões conservadores da favela.) “Uma coisa é ser-se jovem e decidir ir para o bairro de lata. Para mim, não foi assim. Não havia ninguém. Não havia nada de pitoresco aqui. Foi essa a minha universidade, aquele período em que se está numa posição de absoluta vulnerabilidade. E isso nunca me abandonou.”
Depois da licenciatura, viveu por pouco tempo com Da Cunha em Goa, de onde ele era, mas acabaram por se separar, e ela regressou a Deli. Arranjou um emprego no Instituto Nacional de Urbanismo e conheceu Pradip Krishen, um cineasta independente que lhe ofereceu o papel principal feminino em Massey Sahib (1985), um filme passado na Índia colonial, em que fazia de pastora. Roy e Krishen, com quem mais tarde casaria, colaboraram noutros projectos depois desse, incluindo Bargad, uma série televisiva de 26 episódios que nunca chegou a ficar terminada sobre o movimento independentista indiano, e dois filmes, Annie e Electric Moon (1992).
Em 'Massey-sahib' (de 1985), de Pradip Krishen, Roy fazia o papel de pastora na Índia colonial
Os antecedentes de Krishen não poderiam ser mais diferentes dos seus. Académico em Balliol [Oxford] e ex-professor de História, Krisher, um viúvo, vivia com os pais e dois filhos numa casa ampla no bairro chique de Chanakyapuri. Quando se juntaram, mudaram-se para um apartamento autónomo no piso de cima. Roy mergulhou no mundo do cinema independente de Deli. Atraíam-lhe os temas progressistas dos filmes, mas era um mundo dominado pelas famílias de elite, um mundo que lhe era estranho e com o qual não tinha ligação. Passava cada vez mais tempo a dar aulas de aeróbica, para ganhar o seu próprio dinheiro, e a dar-se com artistas que conhecia na faculdade.
Já tinha começado a trabalhar no seu romance quando saiu The Bandit Queen, um filme baseado na vida de Phoolan Devi, uma mulher de casta baixa e famosa líder de um gangue, que foi vítima de uma violação em grupo e da prisão. Ficou furiosa com a forma como o filme a retratava: como vítima cuja vida fora definida pela violação e não pela rebeldia. “Quando vi o filme, fiquei fula, em parte porque eu tinha crescido em Kerala, vi aqueles filmes em malaiala [língua regional] em que em todos os filmes — todos os filmes — uma mulher era violada”, diz. “Durante muitos anos, acreditei que todas as mulheres eram violadas. Depois li nos jornais Phoolan Devi a descrever como foi ser violada. Li o livro no qual o filme se baseou e percebi que aqueles tipos tinham acrescentado as suas próprias violações… Pensei: ‘Vocês transformaram a mais famosa bandida da história na mais famosa vítima de violação.” O ensaio de Roy sobre o filme, The Great Indian Rape Trick, publicado na agora defunta revista Sunday, flagelava os autores de Bandit Queen, referindo que eles nem sequer se incomodaram em encontrar-se com ela ou em convidá-la para o visionamento.
O artigo alienou muitos dos que trabalhavam com Roy. Krishen, que dá mostras de uma lealdade inabalável mesmo depois de se terem separado, refere que foi visto como uma traição nos restritos circuitos cinematográficos de Deli. Para Roy, foi uma lição sobre como funcionam os media. “Vi com muita atenção o que aconteceu a Phoolan Devi”, afirma. “Vi como os media nos podem escavar até ficar só uma concha oca. E tive sorte em aprender com isso. Quando chegou a minha vez, já tinha as minhas barricadas erguidas.”
Phoolan Devi em 1996. A “Rainha dos Bandidos” foi acusada de matar 22 homens de casta alta como vingança pela sua violação. Chegou a ser eleita deputada, e em Julho de 2005 foi assassinada à porta de casa AFP
Um país nu e faminto
Quando me encontrei com Roy no aeroporto de Nova Deli dias depois de termos falado, ela irrompeu da multidão, ignorando os olhares fixos em si. Tinha recusado o pedido de participar num encontro público em Caxemira, mas mesmo assim continuava a haver algo político no facto de ela viajar para lá uma semana depois de oito soldados indianos terem sido mortos numa emboscada. Seria certamente isso que pensariam os passageiros do voo que apanhámos, peregrinos hindus que iam visitar o templo de Amarnath. De tempos a tempos, enchiam o pequeno avião com gritos “Bom Bhole” ou “Hail Shiva”, com o punho direito erguido em uníssono. Uma vez em Srinagar, a capital, Roy era muitas vezes parada por caxemires que lhe queriam agradecer por falar contra o Estado indiano. Também tinham esperança de que ela concordasse em tirar uma fotografia com eles. O que ela geralmente fazia.
Mas na maior parte do tempo manteve-se longe dos olhares públicos. Estava hospedada em casa de um jornalista amigo e enquanto ele e um colega falavam ao telemóvel, seguindo uma história sobre um confronto que eclodira entre peregrinos de Amarnath e transportadores caxemires, distribuía pacotes de café Lavazza trazidos de Deli, prestando pouca atenção ao assunto. Mais tarde, recusou ir ver um novo documentário sobre a guerrilha naxalita, preferindo ficar a trabalhar no seu romance.
Roy tinha vindo a Caxemira sobretudo para visitar alguns amigos, mas foi difícil evitar o conflito. Dias depois, fomos até ao campo, uma paisagem de canais a brilhar no meio de campos verdes e caminhos empedrados, pontuado por figuras armadas em camuflado. Às vezes são grupos da Força Central da Polícia de Reserva, outras, da polícia local, e uma vez por outra, como se distingue pela protecção na cabeça, soldados das forças de contraguerrilha Rashtriya Rifles. “Havia bunkers por todo o lado em Srinagar quando comecei a vir cá”, diz. “Agora usam vigilância electrónica na cidade. A polícia às claras é para o interior.”
No início daquela semana em Srinagar, o policiamento era descarado. Tinha sido convidada a falar num encontro organizado por Khurram Pervez, que trabalha para a Jammu and Kashmir Coalition of Civil Society [Coligação da Sociedade Civil de Jammu e Caxemira], uma organização que tem produzido relatórios detalhados sobre valas comuns e assassínios à margem da lei em Caxemira. Enquanto umas 40 pessoas estão sentadas no chão de pernas cruzadas — activistas, advogados, jornalistas e estudantes —, Pervez pede que se desliguem os telefones e que estes fiquem à vista para impedir gravações sub-reptícias que possam ir parar às mãos das autoridades.
Roy coloca os óculos de leitura que, juntamente com os livros que tem à sua frente, uma selecção de não ficção que escreveu ao longo dos últimos 15 anos (acabados de ser reeditados pela Penguin India numa caixa de cinco volumes coloridos) deu à reunião um ar de seminário improvisado. Começou por pedir à audiência que discutisse o que lhe ia pela cabeça. Um jovem advogado que cresceu numa vila a cerca de 50 quilómetros de Srinagar contou a história de duas mulheres que, depois de terem sido violadas por soldados, passaram a noite a tremer em partes separadas de um balneário, demasiado envergonhadas para voltar para casa, ouvindo apenas o choro da outra. Roy ouviu atentamente este e outros relatos parecidos, levando ocasionalmente a conversa para lá de Caxemira, para as fissuras e fracturas da própria Índia, incluindo as florestas do Centro indiano, onde passou mais de duas semanas em 2010 com os guerrilheiros de esquerda radical e os seus aliados tribais para o seu último livro, Broken Republic (2010).
“Sabe, sinto-me triste quando estou a viajar pela Índia e vejo caxemires a serem recrutados para as Forças de Segurança da Fronteira”, afirma. “É o que este país faz às pessoas, contratá-las de um lado para as pôr a lutar no outro, contra pessoas que podem parecer à partida diferentes, mas que na verdade enfrentam o mesmo tipo de opressão. E esta é razão pela qual, se calhar, é mesmo importante poder falar para ambas as partes.”
Agarra num dos livros que tem à sua frente, o amarelo-limão Listening to Grasshoppers, e encontra uma passagem do ensaio Azadi ou Freedom. Nele descreve uma manifestação em Srinagar, onde foi em 2008, na qual se pedia a independência da Índia. Lê, numa voz limpa e suave: “O slogan que me atravessou como uma faca foi este: Nanga bhooka Hindustan, jaan se pyaara Pakista” — a Índia é um país nu e faminto, o Paquistão é-nos mais caro do que a própria vida. “Nesse slogan vi as sementes da facilidade com que as vítimas se podem transformar agressores.”
A conversa prolongou-se durante horas e estendeu-se do capitalismo global às alterações climáticas antes de voltar a Caxemira. Os habitantes de Caxemira identificam-se com o Paquistão? Alguns sim, outros notoriamente não. E o papel das mulheres na luta pela autodeterminação de Caxemira? Como podem elas ser ouvidas, se já é tão difícil o serem aqui mesmo, nesta sala? Sob aquela canícula impiedosa, o grupo dividiu-se em facções e começou a mostrar-se cansado e agitado. Foi quando Roy decidiu dar por terminada a sessão com uma piada do filme dos Monty Python, A Vida de Brian. “No filme, Brian, pergunta a um grupo de guerrilheiros: ‘Vocês são a Frente Popular da Judeia?’”, diz enquanto imita o sotaque inglês. “E a resposta ofendida que recebe deste grupo é: ‘Não, de modo nenhum. Somos a Frente do Povo da Judeia’.” A piada, na verdade uma paródia inteligente às facções radicais, deixou Roy a rir à gargalhada. E acabou por mudar a temperatura emocional que já se fazia sentir na sala. Enquanto saíamos e caminhávamos cá fora, já os vários grupos pareciam sentir-se mais à vontade uns com os outros. Mais tarde, um homem que tinha acabado o curso de Ficção, confessou o seu desapontamento por nem se ter chegado a falar de literatura.
À mesa de cozinha
Para além do livro sobre Gandhi, há muito mais coisas que a têm mantido afastada da ficção. Em Maio, quando as guerrilhas naxalitas mataram pelo menos 24 pessoas — incluindo um político do Congresso que formou uma milícia de extrema-direita brutal e a quem Roy tinha criticado no seu último livro —, pediram-lhe imediatamente um comentário, que ela declinou. “Então, o que fizeram foi republicar uma antiga entrevista minha e fingiram que se tratava de uma novidade”, diz.
“Tudo o que eu precisava de dizer de uma forma directa, já o disse. Agora, se o voltasse a fazer, estaria a repetir-me, mas com outros pormenores”, afirma. Estamos na sua sala de estar e ela faz uma pausa, antecipando que a próxima pergunta seja sobre quão política poderá ser a sua ficção. “Não sou o tipo de pessoa que goste de usar a ficção como um meio. Acho que a ficção é irredutível. É ela mesma. Não é um filme, não é um tratado político, não é um slogan. O que alimenta o meu pensamento político, as proteínas de que é feito esse alimento, tem de ser desfeito e esquecido, até que venha à superfície, tal como o suor vem à flor da pele.”
Mas a tarefa de editar na Índia de hoje é uma aventura arriscada. Há ordens do tribunal para que determinados livros sejam retirados de circulação ou nem cheguem mesmo a público, e nem é obrigatório que tenham um cariz político explícito. Ainda muito recentemente isso aconteceu com The Hindus: An Alternative History, da autoria de Wendy Doniger, editado pela Penguin India. Um grupo de pressão conservador hindu moveu um processo e mandou recolher todas as cópias em circulação. A Penguin é também a editora de Roy e ela sentiu-se obrigada a manifestar o seu protesto.
Não revela nada sobre o seu próximo livro, nem mesmo aos seus amigos mais próximos. Mas garante que vem quebrar tanto com a sua não ficção como com o seu primeiro romance. “Não estou a tentar escrever outra vez O Deus das Pequenas Coisas. É muito mais fácil perceber claramente onde está o coração, o centro emocional de um livro que fala sobre uma família — que afinal era do que se tratava emO Deus das Pequenas Coisas — do que este, onde andei mais às apalpadelas conceptuais.” Antes de se embrenhar no ensaio sobre Ambedkar e Gandhi, estava a dar os primeiros passos no novo romance, a desenhá-lo, como costuma fazer quando começa um projecto, a tentar perceber-lhe a estrutura. Depois escreve à mão. O que ela chama “polimento” acontece à mesa de cozinha, com o portátil à frente.
“Não me sinto ligada a nenhum local em particular”, responde quando lhe pergunto sobre a importância da rotina na sua escrita. “O que não preciso mesmo é de ter gente em cima de mim.”
A seguir a O Deus das Pequenas Coisas ser publicado, começou a doar algum do dinheiro que ia ganhando. Mandou o pai, que reapareceu quando viu a filha no filme Massey Sahib mas sem a intenção de lhe extorquir dinheiro, para um centro de reabilitação — ele morreu em 2007. Em 2002, quando ganhou um prémio da Fundação Lannan [de apoio às artes e diversidade cultural], Roy doou o prémio de 253 mil euros a 50 pequenas organizações na Índia. E em 2006 fundou, juntamente com amigos, um fundo onde deposita tudo o que ganha com os seus trabalhos de não ficção para apoio a várias causas progressistas espalhadas pelo país.
“Nunca estive interessada nisso de se ser um escritor profissional, quando se escreve um livro que tem sucesso e depois outro, e outro ainda”, diz, enquanto reflecte sobre como O Deus das Pequenas Coisas a prendeu tanto como libertou. “Há um medo que eu tenho: quando se é famoso, ou se fez alguma coisa, toda a gente quer ver-nos a produzir a mesma coisa, a ser a mesma pessoa, como se nos quisessem congelar no tempo.” Roy está a referir-se ao momento na sua vida em que, farta de ver fotografias suas — o ícone glamoroso da Índia transformado na glamorosa dissidente —, resolveu cortar o cabelo. Mas é fácil percebermos que poderia dizer precisamente o mesmo sobre a situação em que se encontra agora. O ensaio sobre Gandhi e Ambedkar terá cumprido um conjunto de expectativas antes de se poder virar para algo completamente novo. “Não quero essa enorme bagagem. Quero poder viajar com pouca coisa.”
Exclusivo PÚBLICO/ The New York Times
Siddhartha Deb é autor do livro The Beautiful and the Damned: A portrait of the New India  

miércoles, abril 09, 2014

Gao Xingjian llama a la revolución de la cultura /// EL PAÍS

Gao Xingjian llama a la revolución de la cultura | Cultura | EL PAÍS





"Penetras de nuevo en las tinieblas que su voz te ha traído".
Gao Xingjian
"Estamos en una crisis no solo económica y financiera, sino también social y de pensamiento, porque hemos quedado estancados en las ideologías del siglo XX. (...) Los intelectuales de todo el mundo deben abordar la realidad y poner en marcha un nuevo pensamiento, un nuevo renacimiento”.
El tono de voz con que Gao Xingjian hace este llamamiento no se parece al que tenía hace unos 15 minutos. Es más alto, comparado con su habitual suavidad. Acaba de dar otro paso en su análisis de la realidad que observa de manera discreta. Él, hombre del Renacimiento y primer Nobel de Literatura chino (2000), con ciudadanía francesa tras haberse exiliado en Francia en 1987, empezó esta conversación hablando de la sobreexposición de algunos autores. Su concepción del artista es otra.
“Mis obras son las que tienen que hablar al lector, al público. No yo con mis opiniones. No soy una estrella, ni un actor. Por eso evito estar siempre presente en los medios de comunicación. Me dedico a hacer lo que sé…”.
Pintura, escritura, dramaturgia, traducción, crítica y, ahora, dirección de cine con El duelo de la belleza. Son los placeres de este hombre que recoloca el mosaico de la vida en una de las almenas de la Alhóndiga de Bilbao, en el VII Festival Internacional de las Letras, Gutunzuria. Pronto, su rostro de amable neutralidad empieza a acompañar sus palabras, que son emociones, alrededor de una pequeña mesa redonda.
“…la libertad de pensamiento y de reflexión alejada del ruido externo son esenciales para el artista. Solo así puedes realmente llegar a una expresión más profunda y estética...”.
Más que nunca busca la concentración. El Nobel le rompió su refugio. Pero no su contemplación de la belleza, ni del sentir de los latidos del mundo. Agudizó el oído a los años por venir.
“…estamos en una crisis no solo económica, sino también social y de pensamiento porque nos hemos quedado...”.
Nacido en Ganzhou, China, hace 74 años, el autor de La montaña del alma y El libro de un hombre solo considera que el compromiso del artista debe ser con el arte. No cree en la creación que da lecciones morales o hace juicios políticos.

Su mirada noble se torna severa, sí, ni triste ni nostálgica porque él haya padecido la censura y el maltrato a la cultura en China. Las manos sobre la mesa. Solo con sus palabras.
“...tenemos una gran riqueza de pensamiento humanista, pero frente a todo esto, ¿qué puede hacer un pobre individuo frágil frente a la sociedad, a la política, a la sociedad de consumo; frente a la degradación de la naturaleza y la condición que nos rodea? La gran pregunta es cuál es el auténtico valor del individuo y qué puede hacer...”.
“…hablo de la necesidad de un pensamiento que supere esa fragilidad del mundo. Hay que acabar con ideologías como el marxismo que dio lugar al comunismo y a dos revoluciones: la rusa, que desencadenó las ideas de Lenin, y la dictadura china con Mao Tse Tung que propició guerras y una dictadura nunca vista. En el siglo XX, también, surgió la ideología del nacionalismo que causó grandes problemas que llegaron al fascismo y causaron las dos guerras...”.
El tono bajo de su voz queda atrás. Piensa que anterior a los agobios de la crisis económica están los de la creación.

Gao Xingjian se alía aquí con sus brazos que abre a la altura del pecho con las manos abiertas. Vestido de negro y con la cabeza semiblanca, su emoción no se detiene.
“...el liberalismo también nos ha llevado a la situación actual, donde la ley de mercado lo invade todo, incluso la literatura. Y tanto ella como el arte se han convertido en productos de consumo, y asistimos a esta proliferación de best-sellers. Ya no es una literatura de pensamiento, es un producto de consumo al dictado de la moda...”.
“...el posmodernismo ha sido catastrófico, es una ideología que ha influido muchísimo en la manera de crear y de pensar. Pero ¿qué es el posmodernismo? Está vacío de sentido, como modelo, lenguaje, en sentido gramatical. Es un callejón sin salida…”.
El artista echa su cuerpo para atrás y sus palabras se robustecen, igual que los ensayos inéditos en español que editarán Península y El Cobre.

El semblante pesimista cambia con una sonrisa y un gesto que busca la aprobación.
“...lo que hace falta es que los intelectuales, los artistas y los medios de comunicación aborden en un gran debate cómo hacer esa creación, qué hacer ante la situación. Hay que liberarse de los corsés del siglo XX. Igual que hubo un Renacimiento después de la Edad Media que generó un nuevo pensamiento, hay que hacer un llamado a los intelectuales para que aborden esa realidad y no dejar la solución en políticos y economistas...”.
“...este nuevo renacimiento tiene que ser el punto de partida: en Italia ya hubo uno y otro en Francia con la Iustración que luego se extendieron por el mundo. El renacimiento actual no tiene que nacer en un país. Al ser problemas universales tiene que ser global. Los intelectuales del mundo tienen que enfrentarse a la realidad. Confío mucho en los europeos...”.
El artista explica la necesidad de esa revolución que cree está en gestación y que debe incluir a Rusia y China.
“…aunque no creo que de estos países vaya a salir este nuevo pensamiento. Su situación es otro gran debate. Recién han descubierto el capitalismo que en Occidente ha mostrado fallos. Rusia y China giran sobre lo mismo y es absurdo. Han llegado en un momento en que aquí…”.

“…no conozco sus trabajos. Me considero muy lejos de ellos porque China ya está muy lejos en mi vida actual…”.
Se lleva la mano izquierda al pecho. Tiene el presente, el futuro y el pasado en la cabeza. El mundo gira en su vida. Y en ese girar China ya está atrás. Ha pasado página. Sus pensamientos y creaciones orbitan sobre Francia, Europa y la humanidad. ¿Y artistas compatriotas suyos como Mo Yan, Nobel de literatura 2012, y Ai Wei Wei?
Tras haber escenificado con su rostro la neutralidad, la preocupación, el reclamo, el llamamiento y el optimismo, Gao Xingjian termina con la estación del entusiasmo. De los escritores a leer en estos tiempos enmarañados: "¡Cervantes!, ¡Dante!, ¡Shakespeare! y la Biblia como texto literario".
Ríe, es el escritor que escribió una suerte de autobiografía titulada El libro de un hombre solo, uno de cuyos pasajes sirve para cualquier persona en estos momentos: "Penetras de nuevo en las tinieblas que su voz te ha traído, como un sonámbulo que pasea sin rumbo, tambaleándose, a la vista de todos, y confundiéndose con esa masa de gente. Los recuerdos recientes se mezclan con los antiguos".

Prosa y teatro de Gao Xingjian

- La montaña del alma
- El libro de un hombre solo
-En torno a la literatura
- Una caña de pescar para el abuelo
- Contra los ismos
- Teatro y pensamiento
- La señal de alarma
- La estación de autobuses
- El salvaje

martes, abril 08, 2014

'Soy un salvaje contemplativo' | Cultura CARLOS OROZA

'Soy un salvaje contemplativo' | Cultura | EL MUNDO





'Soy un salvaje contemplativo' | Cultura | EL MUNDO









Este hombre pertenece irremediablemente a un mundo que no existe. Y si existe es porque él lo ha habitado. Carlos Oroza es un universal del malditismo. Algo así como el druida de una civilización donde es rey de sí mismo. Un gallego de Viveiro (Lugo), parido en casa en 1923. Un poeta huidizo y deslumbrante con perfil de bereber, 'esquelatura' de astilla y ese fulgor metálico en el mirar de quien ha probado el hambre y la sed, de quien ha visto demasiada noche («aunque la noche es una mentira literaria», ataja), de quien se ha abrigado con todo el frío y a quien nunca le falta el adjetivo preciso para cada idiota que le sale al paso.
Oroza es una leyenda casi desesperada. Gimferrer lo dice mejor: «Es un caso único: a la vez la presencia más precisa e imprecisa de la poesía española». En aquel Madrid de los 50/60, cuando las pensiones olían a gas de almendra, este hombre de verbo macizo deambuló por el triángulo de los mejores cafés (Lyon, Gijón y Comercial) con libros de Marcuse en el bolsillo del gabán y sostenido por una dieta de coñac 'perronero' y nescafés que no tenía costumbre de pagar. Gastaba un aspecto de peregrino de esos que se lavan ellos mismos la camisa. Anduvo por la ciudad como un holograma. Embestía contra los poetas de la Juventud Creadora. Era un 'beat' inconcluso en el país menos capacitado para fraguar lo 'beat'. Quería, como Ginsberg, hacer de la oralidad 'performativa' del poema una nueva astronomía.
Oroza está habilitado como pocos para el verso deslumbrante y ambulante, para la respiración larga de la poesía. Es un enlace casi secreto de la estirpe de Rimbaud y los surrealistas. Pero nadie había leído un verso suyo porque escribir era cosa de oficinistas y él es partidario de la salvaje felicidad de recitar echando la memoria por delante, como diciéndolo todo de primera mano. De ahí que la poesía de Oroza sea de un domino exclusivo, radical sin buscarlo, «con el doble orgullo de lo absoluto y de su ocultación» (Gimferrer, de nuevo).
Después de aquellos años de bohemia, chancros, bronquitis y otros males de menor cuantía. Después de madrugadas en portales y pensiones, con la pantorrilla alada para el momento de salir corriendo si la casera reclamaba el mes con intereses. Después de forjarse una biografía de humo en Madrid, con versos herméticos y ambiguos de una iluminación refinada, como llegados del cruce de una pulsión oracular y una sabiduría de ventorro, Carlos Oroza desapareció.
Los más enterados lo fijaban en Vigo. En su tierra, pero sin techo fijo. «Nadie conoce la dirección de Oroza porque eso sería como saber el paradero del viento o de la brisa», comentó en una ocasión el poeta César Antonio Molina. Y acertó. Pues Oroza es un poeta clandestino. En Galicia, tantos años después, se ha convertido en una estrella del rock del extravío. En un exvoto. Y allá se ha recuperado su poesía deslumbrante. El artista Carlos Vilas Bugallo preparó la edición de bibliófilos de 'Preludio a Cabalum. Cabalum y Malú', que incorpora un excelente documento audiovisual con tres videopoemas de Oroza (sólo a la venta por encargo en vilas.bugallo@gmail.com). Y la editorial Elvira reúne en un sólo volumen lo que es hasta ahora la publicación más completa de los poemas de Oroza, con el título de 'Évame'.
Carlos Oroza. 
«Ahí está lo principal de mi escritura», explica el autor. «Dicen que soy un poeta insólito, pero yo no quiero creer en esas cosas. Creerlo es una rendición». Del otro lado del teléfono, el viejo Oroza mantiene la voz alta. «Lo único que queda ya, cuando todo ha estallado, es la poesía».
- ¿A usted de qué le ha salvado?
De ciertas decepciones cuando la vida no responde al deseo que tenemos de la vida.
- ¿Se siente bien en el molde de maldito?
- Bueno, eso pertenece más a otro tiempo. El último poeta maldito fue Federico García Lorca. Yo tan sólo soy un solitario que rechaza el tumulto.
- Rechazo es un concepto que le define bien.
Oroza, en 1964.
- Mi vida ha sido un rechazo tras otro. Y una revisión constante de las cosas, empezando por la cultura, tan amenazada de dogmas. La cultura no es algo inmutable, como algunos pretenden. Igual que no lo es el lenguaje. Hay que transformarlo constantemente. Huir de las obviedades. Ese ha sido mi empeño. Ése y darle a la poesía su sonoridad. Porque la poesía es más voz que signo. Es, sobre todo, ritmo. No rima, sino ritmo.
- ¿Como poeta se siente bien entendido?
- Sobre todo por los jóvenes, que son más libres de pensamiento.
- ¿Sigue memorizando sus textos?
- Claro. Es que yo creo que la poesía está hecha para la oralidad.
En una de sus muchas desapariciones, Carlos Oroza echó el ancla en Ibiza a finales de los años 60 para participar en una película de Manuel Summers: '¿Por qué te engaña tu marido?', adaptación de una novela de Wenceslao Fernández Flórez. Cuando acabó el rodaje decidió quedarse. Allí escribió uno de los poemas icónicos de su obra, 'Malú', un viaje psíquico por Formentera que cantó tiempo después Nico, la musa de la Velvet Underground, de Warhol, de Morrison. «Desde hace miles de años le fueron dados al hombre la tristeza y el asombro, y de un llanto hacia otro llanto un mar para el traslado a Formentera».
Uno de sus recitales míticos fue en Barcelona, junto a Leopoldo María Panero y Carlos Edmundo de Ory. Oroza ha organizado algunas sesiones de mucha zumba. En el año 75, en Pontevedra, leyó en el Teatro Malvar su poema 'Desfile de la Victoria', un alegato antifranquista: «En este lugar se celebra el crimen cada año...». Los militares le quisieron fusilar y él salió escoltado con un grupo de falsos policías. Eso también es Oroza. «Es que ser poeta es un fracaso», exclama.
Ama a Blake, a Rimbaud, a Lorca y a Whitman sobre todas las cosas. «Este último era un tranviario fabuloso. Un poeta esencial capaz de decir cosas así: '¿Que yo me contradigo? Pues sí, me contradigo. Y ¿qué? Yo soy inmenso, contengo multitudes». Pero también cultiva desafectos inquebrantables. El principal, a las fronteras. «Dejad que el trigo crezca en las fronteras», escribe. «Creo en lo universal, nunca en la identidad fronteriza que nos han impuesto. Toda frontera es una construcción ilegal porque secciona el mundo. Creo en la tierra ancha, por eso estoy incapacitado para asumir ningún nacionalismo. Pues el nacionalismo es lo artificial. Nos hemos inventado banderas y las hemos clavado en todas las partes. Es un horror».
- ¿Qué es 'Évame'?
- Un viaje hacia el recuerdo. Hacia lo contemplado. Un canto a la mujer. Y la voz de un hombre que viaja por la vida en dirección contraria.
- ¿Cómo ve el presente?
- Lo que observo no me gusta. Yo soy un salvaje contemplativo y lo que ahora tenemos delante no me interesa en absoluto. No estoy preparado para este sistema injusto.
De Carlos Oroza se dicen muchas cosas. Y quizá alguna sea cierta. Entre tanto, él sólo mantiene militancia en la poesía. Para qué más a los 90 años: «La poesía es un canto al mundo libre, a ese mundo que vive clandestino de nosotros, ¿verdad?», pregunta. Verdad, le decimo

miércoles, abril 02, 2014

70 años de revistas leonesas de poesía y creación (1944-2014)

70 años de revistas leonesas de poesía y creación (1944-2014) | Tam-Tam Press

Portada del dossier sobre las revistas leonesas de poesía más significativas de los últimos 70 años.



Reproducimos aquí el contenido del dossier digital sobre las revistas leonesas de poesía y creaciónmás significativas de los últimos 70 años que se mostrarán juntas, por primera vez, en las vitrinas del Musac (León), los días 5 y 6 de abril de 2014. Una actividad que se enmarca en el ciclo “Nombrando el porvenir. Encrucijada de poetas”, que se celebra en el museo con actividades que se prolongarán hasta el 1 de junio.
Esta publicación se puede descargar desde la página del Musac (pinchar, a la derecha, en “Dossier descargable en pdf”). También se puede ver aquí.
Por ELOÍSA OTERO
Siempre se ha dicho que León es tierra de poetas. Y puede que la frase no sea solo un mito. Aquí, los exploradores de nuevos horizontes y territorios creativos a través de la palabra han alumbrado un buen número de publicaciones, y lo siguen haciendo. Más de 70 años de revistas leonesas de poesía y literatura de creación, algunas con importante relevancia nacional en su momento, así lo atestiguan. En ellas se han dado a conocer no sólo los poetas y escritores de la tierra, sino también muchos otros del panorama nacional e internacional.
Si en 2013 se celebraron los cincuenta años desde la fundación de la revista Claraboya, en este 2014 se cumplen nada menos que setenta años desde la fundación de la mítica revista Espadaña, emblema de los poetas antifranquistas durante algunos de los años más duros de la postguerra española.
Desde el ciclo “Nombrando el porvenir. Encrucijada de poetas” se propone un mirada sobre el abanico de las revistas, publicaciones y fanzines literarios más significativos editados en León en el último siglo, desde las ya casi legendarias Espadaña y Claraboya, que abrieron nuevas vías a la poesía y el pensamiento crítico durante el franquismo, a las más modernas y experimentales, como Azul Eléctrico, Vinalia Trippers, The Children’s Book of the American Birds (del Club Leteo) o la última en marcha, Meando contra Viento, pasando por las publicaciones señeras del último cuarto del siglo XX: AlcanceCuadernos Leoneses de Poesía o El Signo del Gorrión.
Aunque los tiempos cambian, sin duda que estas publicaciones, en su mayoría casi reliquias de los tiempos de la tinta y el papel, siguen teniendo no solo vigencia, sino un innegable encanto. Muchas de ellas se quedaron en aventuras pasajeras, como Yeldo, Cálamo, Margen, Derviche…. pero todas ellas han contribuido, y lo siguen haciendo, al desarrollo de las pasiones y afanes poéticos de un buen número de autores leoneses, algunos de los cuales, con el tiempo, han logrado brillar con luz propia en el ingente panorama de las letras españolas.

ESPADAÑA (1944-1951)

Surgida al calor de la tertulia literaria que tenía su sede en la Biblioteca Azcárate, junto a la Catedral leonesa, la revista Espadaña fue fundada en 1944 por Antonio González de Lama —bibliotecario y sacerdote de ideas liberales—, Victoriano Crémer, Eugenio de Nora, Manuel Rabanal y Luis López Santos -—aunque la responsabilidad de su redacción recayó enseguida sobre los tres primeros—. González de Lama aportó la autoridad moral y el pensamiento crítico, Crémer la concepción de una poesía realista y desarraigada que fue calificada de “tremendista” y De Nora el compromiso político. El inconformismo y afán renovador de sus promotores alentaron además intensas polémicas poéticas desde los primeros números.
Frente a las revistas oficiales de la época —como Escorial (1940-1949) o Garcilaso (1943-1946) entre otras—, Espadaña no contó con protección institucional alguna y tuvo que superar muchas dificultades, incluidas las económicas, para conseguir sacar 48 números en sus casi ocho años de vida. Sin embargo, con el tiempo, esta revista independiente de poesía y crítica se ha convertido en un instrumento esencial para entender la literatura española de posguerra. En ella están representadas las corrientes más significativas de la época, pero también la mejor poesía del 27, junto a los versos de muchos poetas españoles e hispanoamericanos condenados a la marginación por el régimen franquista.
Con una línea editorial comprometida con su tiempo, Espadaña abrió sus páginas a los exiliados, como Luis Cernuda, pero también a los muertos en la guerra, como Federico García Lorca (de quien se publicó por ejemplo una curiosa serie de poemas en gallego) o Miguel Hernández. La labor de crítica literaria de Antonio González de Lama, o las aportaciones de Dámaso Alonso, Vicente Aleixandre y Gerardo Diego conviven con poemas de César Vallejo y Pablo Neruda, o con las colaboraciones del grupo “madrileño” formado por poetas cercanos al régimen como Valverde, Leopoldo Panero, Rosales y Vivanco. EnEspadaña publicaron Rafael Alberti, León Felipe, Francisco Ayala, Camilo J. Cela, Barral, García Baena, Álvarez Ortega, Carlos Bousoño, Caballero Bonald, Cirlot, Carmen Conde, Aranguren, Joan Fuster, Leopoldo de Luis, Ory, José Luis Sampedro, Miguel Labordeta, José García Nieto y hasta Fernando Fernán-Gómez, por citar algunos pocos. Se puede decir que la revista logró reunir a todas las generaciones poéticas españolas vivas, incluyendo la más joven —Antonio Pereira, José Hierro, Ángela Figuera Aymerich, Gabriel Celaya, Blas de Otero…—. A partir del número 22 se publicó además unaAntología parcial de la poesía contemporánea, en fascículos que podían encuadernarse aparte.
Desde Espadaña se buscaba informar sobre las publicaciones de poesía más importantes de aquellos años, españolas y de otros países, así como traducir a los grandes poetas extranjeros del momento, con atención especial a los europeos: Yeats, Claudel, D’Annuncio, Rilke, Miguel Torga…
Espadaña abrió sin duda nuevos caminos a la poesía, rehumanizando el verso en aquellos años de la posguerra franquista. Las diferencias vitales e ideológicas entre sus fundadores precipitaron el fin de la publicación, a cuyo frente estuvo Crémer casi en solitario durante la última etapa.

CLARABOYA (1963-1968)

En 1963 nació Claraboya, de la mano de cuatro poetas veinteañeros, cuatro “ácratas apacibles” en palabras de Agustín Delgado, uno de sus promotores junto a Luis Mateo Díez —que más tarde abandonaría la poesía por la narrativa—, Ángel FierroJosé Antonio Llamas y el pintor Higinio del Valle.
Bernardino M. Hernando, Eutimio Martino y Antonio González de Lama figuraron entre sus mentores, y entre sus colaboradores contaron con Antonio Gamoneda, Antonio Pereira, César Aller, Gaspar Moisés Gómez, el pintor Manuel Jular…
Sus impulsores pretendían una revisión de posturas literarias y defendían una poesía “dialéctica”, en oposición a la “poesía veneciana” y a los planteamientos de la antología Nueve novísimos poetas españolesde Castellet (a los que tacharon de neodecadentes y neocapitalistas).
En aquellos años oscuros de la dictadura Claraboya buscaba convertirse en el vehículo de una nueva generación literaria, y marcó un hito fundamental en la renovación poética de la década de los sesenta. Su cierre en 1968 por orden de Manuel Fraga, entonces ministro de Información y Turismo, supuso la publicación de un libro en la editorial El Bardo: Equipo Claraboya: Teoría y Poemas, en el que se recoge de forma valiente toda la historia de la publicación.
A lo largo de los 19 números que aparecieron entre octubre de 1963 y febrero de 1969 el lector va de sorpresa en sorpresa. Porque en Claraboya, como se ha ocupado de estudiar Juan José Lanz, habitó la vanguardia, una vanguardia comprometida y crítica, junto al realismo más directo y la poesía social. Gabriel Celaya, Pere Gimferrer, Manuel Vázquez Montalbán, José-Miguel Ullán, Diego Jesús Jiménez, José María Guelbenzu, Aleixandre, Gamoneda, Claudio Rodríguez, José Ángel Valente, Félix Grande, Francisco Ribes… son algunas de las firmas que se suceden por sus páginas, junto a traducciones de textos de poetas no hispanos incuestionables (como Nazim Hikmet, traducido por Gamoneda).
Entre los méritos de esta publicación destacan la ruptura consciente con la poesía precedente, de carácter social-intimista, su afán renovador desde un espíritu lúcido y crítico, la apertura hacia la poesía extranjera, hacia la poesía hispanoamericana y los poetas del 27, Cernuda sobre todo. También dedicó números especiales a los poetas gallegos y a los poetas cubanos pujantes en aquella época, así como un monográfico volcado hacia la beat generation (Ginsberg, Kerouac, Corso, Ferlinghetti…).
Como ha advertido el crítico Manuel Rico: “En el fondo, Claraboya fue el espejo de una etapa poética mucho más compleja de lo que ha establecido la historia oficial. Un tiempo joven bajo la dictadura. Un tiempo en el que, contra el miedo, Llamas, Mateo Díez, Fierro y Delgado crearon la casa de todas las rupturas y todas las iluminaciones. Poéticas, por supuesto”.

YELDO (1973-1974)

Si bien solo tenemos noticia de dos números (y no hemos conseguido encontrar ningún ejemplar físico para esta exposición), la revista Yeldo se presentó en noviembre de 1973 como una publicación que, “desde su independencia, quería servir de orientación y acogida para los poetas en ese momento”.
Estuvo alumbrada por un efímero grupo de jóvenes poetas leoneses que adoptó el mismo nombre, el “grupo Yeldo”. Ellos eran: Vicente Presa, Manuel Ballesteros Alonso, Enrique Álvarez, Miguel Ángel Benavente, Agustín Tuñón y José María Ampudia.
El sumario del primer número (según refleja una reseña publicada en la revista Tierras de León, nº 17, junio de 1973) recoge las firmas de los miembros del comité de redacción, a las que se añaden las de José Luis Jover, Pedro Beso, Gaspar Moisés Gómez, Emilio Ríos Ruiz, Florentino Huerga, Mary Carmen de Celis y Jaime Siles, con ilustraciones de José María Ampudia.
El ABC del 19 de abril de 1974 recoge la reseña de un nuevo número de Yeldo en “Homenaje a Vicente Aleixandre”, con ilustraciones de Tino Gatagán. Según la reseña, colaboran en este cuaderno fechado en abril de 1974, a cargo de Esteban Carro Celada, los poetas del grupo junto a otros como Luis Eduardo Aute, Juan Gil-Albert, Gamoneda, Luis Antonio de Villena, Félix Grande y Salvador Espríu, por citar a los más reconocidos.

BARRO (1975-1977)

Barro fue una revista radiofónica de literatura y poesía que se mantuvo en las ondas —amparada por Radio Popular de León— entre 1975 y noviembre de 1977. Cuatro fueron sus promotores, los poetasMercedes Castro, Julio Llamazares, José Carlón y Miguel Escanciano.
Aquella periódica reunión radiofónica se materializó además en una publicación en la que los cuatro autores, muy jóvenes entonces, dieron cuenta de sus primeras creaciones poéticas: el libro homónimoBarro (1976).

CUADERNOS LEONESES DE POESÍA (1977-1979 y 1981)

En noviembre de 1977 se publica el primero número de los Cuadernos Leoneses de Poesía, de vocación bimensual, en cuyo número cero colaboraron los poetas e ilustradores José Carlón, Ignacio Otero, Luis Carlón, Ildefonso Rodríguez, Escilo y Miguel Lastres (seudónimo del poeta Miguel Suárez), con maqueta de Eduardo López.
A lo largo de los siete números que vieron la luz hasta septiembre de 1979 se fueron sumando nuevos colaboradores: Julio Llamazares, Edita Piñán, Tomás Salvador González, Jacinto Santos, Miguel Marinas, Luis Federico Martínez, Aldo Sanz, Isabel Lucio Villegas… La tirada, según recuerda Ildefonso Rodríguez, uno de sus principales promotores, rondaba los 500 ejemplares por cada entrega.
El número 7 tuvo un carácter muy especial, ya que estuvo dedicado a “La escritura en los manicomios”. Todos los textos y dibujos fueron sacados de un manicomio, aunque publicados de forma anónima, sin firmar.
En abril de 1981 vio la luz el que sería el último número de los Cuadernos… titulado “Seis cantos”, con poemas de Miguel Lastres, Domingo Santos “Txomín”, Juan Carlos Valle, Tomás Salvador González e Ildefonso Rodríguez.
Además, la revista editó una separata, en diciembre de 1978, con el primer libro del poeta Aldo Z. Sanz,RRA.

ALCANCE (1978-1981)

A finales de los años 70, en plena Transición democrática, se gesta la revista Alcance, de talante plural y abierto a todas las corrientes poéticas.
El primer número vio la luz en la primavera de 1978 de la mano de los poetas Gaspar Moisés Gómez —que figura como director—, Ángel García Aller, Antonio Merayo y Alfonso García, con ilustraciones de Enrique Rodríguez “Kiker”. Entre sus colaboradores figuran Manuel María, José María Merino, Vicente Presa, Rafael Guillén, Jaime Siles, Antonio Colinas, José Luis García Martín, Carlos Sahagún, Ricardo Bellveser… Más adelante, en los siguientes números, se pueden encontrar firmas como las de Aníbal Núñez, César Augusto Ayuso, Alfredo Buxán, Luis Antonio de Villena, Juan Margarit, Horacio Salas, Julio Llamazares…, o las de los argentinos María Lucrecia Romera, Antonio Requeni y María Cristina Arostegui, la paraguaya Josefina Pla o el boliviano Pedro Shimose.
Ya en sus primeras páginas se puede leer esta declaración de intenciones: “La revista Alcance ve la luz después de haber roto las aguas mínimamente necesarias: un grupo de escritores —no un grupo poético limitado por razones de generación, de ideología o de estética— han conjuntado el interés común por la poesía para hacer posible esta publicación. (…) No será Alcance amparadora de un determinado tipo de poesía, por serlo de toda sin discriminación. Tampoco pretende llenar ningún vacío, ni ser sucesora ni precursora de ninguna otra”.
A partir de ahí se sucedieron nueve números. En el nº 2 se incorporaron dos novedosas secciones: la “musicación de un poema” (en ese número, por ejemplo, Angel Barja puso música a un poema de Gaspar Moisés Gómez) y la transcripción de una “mesa redonda” previa, en la que profesores, escritores y poetas se habían reunido para abordar temas de actualidad poética (difusión de publicaciones, revistas literarias…).
Aunque la revista cifre en nueve sus números, físicamente solo fueron siete. El sexto, aparecido en 1980, tiene carácter triple (quizá en función de su voluminosidad) y está dedicado a la “Poesía leonesa hoy”, con colaboraciones de Crémer, Pérez Herrero, Pereira, Gamoneda, Bernardino M. Hernando, José Antonio Carro Celada, Fierro, Merino, Colinas, José E. Martínez, Vicente Presa, Antonio Merayo, Julio Llamazares… El ejemplar lleva ilustraciones de Sendo y un estudio crítico de Francisco Martínez García. El último número de Alcance, el 9, se centró en cambio en textos inéditos de Carlos Edmundo de Ory.

MARGEN (1980)

En octubre de 1980, Carlos Suárez González, entonces joven escritor e inquieto estudiante de Periodismo, puso en marcha la revista Margen, de la que solo salieron dos números. En el comité de redacción figuran, además de Carlos Suárez, cinco jóvenes universitarios leoneses: Florentino Aláez Serrano, José María Alonso Rodríguez, Rafael González Cañal, Rosario González Sánchez y Pablo Lanza Suárez.
El número 1 incluyó textos de Juan Benet (sobre Región) y Antonio Gamoneda, así como una carta inédita de Buenaventura Durruti a su hermano Pedro, una pequeña antología de poesía leonesa joven (con poemas de Julio Llamazares, Miguel Escanciano, José Carlón, José Luis Graupera, Miguel Ángel Benavente, Manuel Ballesteros, Agustín Tuñón, Pío Cimadevilla, Luis Algorri, José Luis Manso, Roberto Charro, Florencio Cruz, Pablo Lanza y Carlos Suarez), una crítica de cine a cargo de Benigno Castro, y una separata con cuentos de Enrique Álvarez.
El número 2 redujo el tamaño de la revista a la mitad, y lleva el título de Margen. Cuartillas de crítica y ensayo. Incluye textos y poemas de Emiliano Alonso Pelegrín, Francisco Pérez Herrero, Alfonso García, José María Alonso Rodríguez y Glyn M. Hambrook (que escribe sobre Baudelaire) y reproduce una conferencia de Gabriel Marcel sobre “La condición del intelectual” y un discurso de Giner de los Ríos sobre la Institución Libre de Enseñanza.
En paralelo a la revista, Carlos Suárez creó también a principios de los 80 el Grupo Editorial Margen, donde de manera artesanal vieron la luz unos pequeños cuadernillos con obras de Juan Benet y Lucio García Ortega, y poemas de Hilario Franco, Eloísa Otero, Juan Carlos Pajares, Elena Soto…

EL SIGNO DEL GORRIÓN (1993-2002)

En el invierno de 1993 apareció el numero 1 de esta revista exquisita y singular cuyo nombre alude a un bazar de Nueva York donde el artista Joseph Cornell se surtía para componer sus famosas cajas: El signo del gorrión.
En su consejo editor figuraban nueve escritores de Castilla y León vinculados por la amistad y por aventuras literarias comunes previas: Miguel Casado, Olvido García Valdés, Luis Marigómez, Gustavo Martín Garzo, Carlos Ortega, Esperanza Ortega, Ildefonso Rodríguez, Tomás Salvador González yMiguel Suárez. Las ilustraciones de aquel número (y de los siguientes) fueron de José-Miguel Ullán y el diseño de Manuel Ferro. Este equipo, con pequeñas variantes, continuó produciendo la revista hasta el número 26, en el invierno del año 2002, con una tirada de mil ejemplares por número.
En su primera entrega se incluyeron inéditos de tres leoneses: Antonio Gamoneda, Javier Martínez Alejandre y Aldo Z. Sanz. Durante los diez años que siguieron a su fundación, una larga lista de interesantes poetas y autores de todo el mundo publicó en esta revista con sede en León, Valladolid y Arenas de San Pedro —las ciudades donde vivían los miembros de su comité de redacción—.
La revista atravesó dos etapas. La primera, con ejemplares de gran formato, se realizó íntegramente en León, en total 16 números. En la segunda etapa, con un formato “de bolsillo”, fue la editorial madrileña Trotta la que se encargó de su edición y distribución. Como revista independiente de cualquier organismo cultural, sólo la publicidad cubría los gastos de su publicación.
El signo del gorrión perteneció además al consejo editorial de la revista hispano-portuguesa Hablar/falar de poesía. Sobre el espíritu que animó esta aventura colectiva, reproducimos unos extractos de la despedida que se divulgó en su último número: “(…) un lugar de escritura libre, mestizo y oblicuo, un don de lenguas. Nombres sonantes y nombres desconocidos, vecinos y alejados, claros y confusos: todos reunidos en una casa amiga. (…) un lugar de libertad para la escritura, sin sometimiento a ningún dictado exterior, sin miedo al riesgo ni al fracaso”.
Innumerables son las firmas de poetas, narradores y pensadores que se sucedieron en sus páginas y en sus más que curiosas secciones a lo largo de casi una década, unos con textos originales, otros traducidos: Margaret Atwood, Christine Monot, Francisco Pino, Jaroslav Seifert, Paul Celan, Joseph Cornell, Vicente Núñez, Antonio Pereira, el cineasta Jonas Mekas, Bernard Noël, William Carlos Williams, Agustina Bessa-Luís, Maurice Blanchot, Samuel Beckett, Paul Auster, Mallarmé, Bruno Schulz, Derrida, Sylvia Plath, Jean Genet, Bernardo Atxaga… La revista recuperó textos y cartas inencontrables (de Kafka, John Keats, Cortázar…), entrevistas (Lezama Lima, Marjorie Perloff, Jorge Luis Borges…). En fin, cada número es una mina llena de sorpresas y, entre ellas, también se van sucediendo las mejores voces de la poesía en español de finales del siglo XX y principios del XXI.

VINALIA TRIPPERS (1996…)

Nacida en 1996, Vinalia Trippers dio a la luz nueve números hasta 2005, otros nueve números del suplemento Poemash y cinco libros de bolsillo. También se organizaron con este sello dos encuentros de editores independientes y numerosos eventos, encuentros y recitales de poemas, muchos de ellos en la desaparecida y entrañable buhardilla del CCAN.
Su fundador, el poeta, escritor y editor Vicente Muñoz Álvarez, recuerda que la idea original fue la de editar un fanzine de relatos y cuentos breves donde se diera cabida a cierto tipo de textos “que por su incorrección política —por temática, estética o ideología— no solían encontrar hueco en otras revistas y suplementos de la época”.
Tras un par de años de silencio Vinalia Trippers volvió a reaparecer en 2007 con un número que quería ser de despedida: la cuidada antología de relato breve Tripulantes: Nuevas aventuras de Vinalia Trippers. Pero había ganas y fuerzas para seguir. En 2010 salió otro número monográfico, Plan 9 del espacio exterior,dedicado a la ficción pulp, y en 2011 se publicó el volumen titulado Trippers from the Crypt, un homenaje a la mítica revista Tales from the Crypt. Su último número hasta el momento, Spanish quinqui, es un especial dedicado a la España Cañí de los 70, al lumpen de la delincuencia y la marginalidad.
Junto a Vicente Muñoz, forman parte de Vinalia Trippers los escritores y poetas Silvia D. Chica y Alfonso Xen Rabanal, el diseñador gráfico Rodrigo Córdoba, el ilustrador Miguel Ángel Martín y la fotógrafa y diseñadora gráfica Julia D. Velázquez, así como un buen número de colaboradores habituales: Toño Benavides, Mik Baro, Nacho Abad, David González, José Ignacio Escuín, Patxi Irurzun, Gsús Bonilla, Felipe Zapico, Pepe Pereza, Julio César Álvarez, Eva Vaz, Yaiza Martínez, Roxana Popelka… entre otros muchos.

AZUL ELÉCTRICO – Cultura subterránea (2005-2010)

Impulsada por Julio César ÁlvarezAzul eléctrico-Cultura subterránea nació en la primavera del 2005 (el último número aparecería en octubre de 2010). En total se publicaron trece números, con una amplia tirada de carácter gratuito (1.500 ejemplares trimestrales), apoyada por cartelería, fiestas con directos de grupos nacionales e internacionales, dj’s…
Julio César Álvarez (edición y dirección) y Diego Chamorro (diseño) dieron forma a una revista con espíritu underground, visualmente profesional, que fue una especie de híbrido entre fanzine y revista de calidad.
“La decisión de crearla fue sobre todo visceral e impulsiva (si nos hubiéramos parado mucho a pensarlo probablemente no se hubiera hecho nunca). Tenía tanta pasión entre sus páginas que gustó a todo el mundo”, recuerda Álvarez.
En Azul eléctrico se tocaron temas muy abiertos, como la violencia, el malditismo o el futuro. Contenía cuatro grandes secciones: pensamiento, música, cine y literatura; y en ella colaboraron más de 40 personas, incluyendo firmas jóvenes de la cultura local: Leticia Gavilanes, Esther G. Couso, Eduardo García, Jorge Villasol, Sergio Doctor, Paula Baldó, Raúl Suárez, Natxo Sobrado, Julia Cubillo, Javier Ordás, Vicente Muñoz Álvarez, Rafael Saravia, Alberto R. Torices o Jorge Pascual, entre otros.
“Creemos y defendemos toda forma de arte. Apostamos, en igual medida, por la forma y el contenido. Escritura esencialmente libre, creativa e independiente. La publicación ofrece textos originales de difícil acceso en la mayor parte de los casos”, fueron algunas de sus premisas.

THE CHILDREN’S BOOK OF AMERICAN BIRDS (2005…)

Promovida desde el Club Cultural Leteo que encabeza en León el poeta Rafael Saravia, esta preciosa revista se creó en 2005 con el objetivo de ir reuniendo en torno a ella a jóvenes narradores, poetas e ilustradores del panorama nacional, dando cabida a las literaturas que, por un motivo u otro, el Club Leteo no podía dar salida en sus colecciones de libros.
En el equipo editor del primer número, además de Saravia, figuran los poetas y escritores Nacho Abad, Miguel Paz Cabanas, Sergio Santa Cruz Santamarta Alberto R. Torices —a los que se unirían posteriormente José Manuel Donís, Yago Ferreiro y Sandra Muñiz—, así como el diseñador Javier Arce, quien aportó el curioso nombre de esta pequeña y exquisita publicación, The Children’s Book of American Birds. “Ese Libro infantil de los pájaros americanos existió de verdad en EEUU: era un libro con el que los niños de los años cincuenta aprendían a escribir redactando nombres de pájaros, un poco del estilo de nuestros cuadernos Rubio. Nos gustó la idea de ‘no dejar de aprender a escribir nunca”, apunta Saravia, orgulloso del catálogo de 500 autores que han participado hasta ahora en los diez números de la revista, cada uno de ellos representado como una rara avis. Autores de todas las edades y condiciones, entre ellos, Fernando Arrabal, Jorge Riechmann, Gamoneda, Tundidor, Antonio Lucas, Oscar Curieses, Víktor Gómez, Sara Paz, Ben Clark, Déborah Vukusic, Inma Luna, Raquel Lanseros, Carmen Camacho, Vicente Muñoz, Uberto Stabile, Roxana Popelka, Tomás Sánchez Santiago, Rubén Mielgo…
La tirada es de 500 ejemplares y su periodicidad semestral, y aunque el nº 10 ha sido el último publicado hasta el momento —en diciembre de 2010, con motivo del décimo aniversario del Club Leteo—, sus promotores tienen previsto celebrar por todo lo alto los 15 años de vida de Leteo, en 2015, con una entrega muy especial de la revista, que llegaría así a su nº 11.

MEANDO CONTRA VIENTO (2013…)

La última publicación literaria nacida en León hace solo unos meses, en julio de 2013, es el fanzine Meando contra viento, conducido por Nícolas Marper (alter ego del fotógrafo Santos M. Perandones), con una previsión de tan solo cuatro números (el cuarto aún no ha visto la luz a la hora de escribir estas líneas) y una tirada de 300 ejemplares por cada número.
“Se trata de un cuaderno-fanzine donde he invitado a colaborar a distintos escritores, escultores, fotógrafos, ilustradores, pintores… para que plasmen su manera de ver o sentir la transgresión”, explica su promotor, para quien Meando contra viento es, sobre todo, “una manera de expresar libremente nuestra forma de ver las cosas, tal cual las sentimos o la vemos. Con un único tema: la tras(n)gresión”.
El título de la revista fue idea de Felipe Zapico, uno de los colaboradores de este cuaderno trimestral que también tiene vocación musical. Julia Getino, guitarrista y compositora, ideó una primera partitura que fue evolucionando a lo largo de los tres números editados hasta el momento; en la cuarta y última entrega —que saldrá en la primavera de este 2014—, se estrenará la sintonía completa. Además, con el nº 4 (y último) se quiere hacer una exposición con obras originales de algunos de los colaboradores, entre los que figuran José Ramón Vega, Carlos Salcedo, Pepe Pereza, Antonio Morala, Nuria Palencia, Aldo Sanz, Víctor M. Díez, Alejandro Saénz de Miera, Rafael Saravia, Charo Acera, Cecilia Quílez, Eduardo Fandiño, Alfonso ‘Xen’ Rabanal, Luis Melón… y otros muchos, en su mayoría de León, aunque también se invita a participar a creadores amigos de otras tierras.
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