Só a rejeição total da realidade no-la pode mostrar na sua verdade."
Santiago Lopez-Petit*
"Queremos mais democracia". Queremos equipas governativas a votação, em postal? Caderneta de cromos? Calendário, em calções e saiote? Queremos a meritocracia a funcionar, é isso? Queremos os mais competentes, os menos corruptos? Será isso “mais democracia”? Mas há democracia com representantes? E com cargos estatais? Existe democracia legitimando a preservação de uma corporação assente no Estado e que dispõe da possibilidade de regular todos os âmbitos da vida humana? Claro, uma corporação mais transparente, mais zelosa e cumpridora dos seus compromissos aguentar-se-à mais tempo no poder. Existe democracia sem auto-governo?
(continuar a ler a "Brevíssima leitura cruzada do Manifesto do 15 de Outubro" abaixo...)
Salvar esta democracia, não é salvar o capitalismo?
Sexta-feira, 14 de Outubro, 22h
Debate indignado, com Vanessa Martins, João Vilela e António Alves da Silva (moderador)
Na véspera da Manifestação Mundial do 15 de Outubro por uma Democracia Verdadeira torna-se urgente debater o que é isso de democracia. A falsa e a verdadeira. A formal e a real. A democracia política e a económica. A democracia da elites e a democracia para todos. A questão não é nova. Mas tem hoje uma nova urgência face à crise financeira do capitalismo e ao coro de protestos que varre hoje o mundo inteiro. Como dizia Antero de Quental: «A crítica eis, por ora, qual deve ser a nossa ocupação. Fazer praça, limpar o terreno para a nova seara: a colher, por ora, só vejo joio e ervilhaca.»
A Gato Vadio / Saco de Gatos - Associação Cultural e Espaço de Intervenção Social - convoca os manifestantes à auto-organização em assembleias populares no Porto, na Praça D. João I depois de finalizada a manifestação do 15 de Outubro e a fazerem a democracia directa que os anima.
Se a palavra revolução já desapareceu dos teus lábios não querer dizer que ela seja passageira.
* Na Livraria Gato Vadio encontram "A Mobilização Global", de Santiago Lopez-Petit
Brevíssima leitura cruzada do Manifesto 15 de Outubro
"retirem o memorando. vão embora. não queremos o governo do FMI e da troika!"
É possível rejeitar o FMI e a troika, sem pôr em causa a existência de “ cargos públicos [como] os responsáveis pelo Banco de Portugal ao Banco Central Europeu, da Comissão Europeia ao Procurador Geral da República”? É possível rejeitar aquele, mantendo e defendendo quem o convida? Quem lhe prepara o terreno?
"queremos ver redistribuídas radicalmente as riquezas e a política fiscal mudada, para fazer pagar mais a quem mais tem: aos banqueiros, ao capital e aos que não pagam impostos".
Que riqueza? Aquela que assenta na ignominiosa depradação de recursos? Na depauperação dos ditos países pobres? Distribuir a riqueza actualmente gerada pela lógica capitalista, ou seja, tabelar o mergulho insano na hiper-produção, no hiper-consumo e no hiper-desperdício? Como não questionar essa riqueza em si? Como é ela gerada? Que fim tem? O que cumpre essa realização de riqueza, senão, precisamente a situação social de colapso... até nos ditos países ricos, como Portugal, Grécia, Espanha...
"queremos o controlo popular democrático sobre a economia e a produção. "
Porque ainda não se quer a economia e a produção para si. Única forma de controlá-la: fazer a sua própria economia e dispor autonomamente dos meios para decidir o que produzir. A autogestão exclui a necessidade de pensar na “a economia” ou na “a produção”, entendidas como supra-entidades. Quer-se, ingenuamente, controlar melhor aquilo que não controlamos de todo?
"queremos trabalho com direitos, zero precários na função pública (em Portugal o maior contratador de precários é o estado), a fiscalização efectiva do cumprimento das leis laborais e o aumento do salário mínimo."
O precário é necessário como nunca para que nem sequer haja o assomo de pôr em causa o trabalho assalariado e a base injusta em que ele assenta. O precário é aquele que reivindica, aquele que define o seu corpo político, pela vontade de integração plena numa relação exploratória. Ainda há algumas décadas se lutava contra o trabalho assalariado, constestando o princípio do lucro, etc.
Será que o precário só passa a viver depois de ter trabalho com direitos, um emprego na função pública, uma comissão de vigilância aos patrões e 600€? Para poder viver a vida feliz que a sociedade lhe vende? Para encontrar um lugar ao sol na hiper-produção, no hiper-consumo e no hiper-desperdício? A vida não vem antes do direito e do trabalho-no-sistema-
"queremos mais democracia: "
Queremos equipas governativas a votação, em postal? Caderneta de cromos? Calendário, em calções e saiote? Queremos a meritocracia a funcionar, é isso? Queremos os mais competentes, os menos corruptos? Será isso “mais democracia”? Mas há democracia com representantes? E com cargos estatais? Existe democracia legitimando a preservação de uma corporação assente no Estado e que dispõe da possibilidade de regular todos os âmbitos da vida humana? Claro, uma corporação mais transparente, mais zelosa e cumpridora dos seus compromissos aguentar-se-à mais tempo no poder. Existe democracia sem auto-governo?
"queremos a eleição directa de todos os representantes cargos públicos, políticos e económicos: dos responsáveis pelo Banco de Portugal ao Banco Central Europeu, da Comissão Europeia ao Procurador Geral da República"
Eleição directa de cargos públicos, para nos sentirmos mais responsáveis pelas estruturas que gerem a catástrofe e que assentam a sua base na autocracia? Não só não questionar as armaduras do sistema político do capitalismo, mas ainda por cima conferir-lhes um maior grau de legitimidade?
"queremos mais transparência no processo democrático: que os partidos apresentem a eleições, não somente os programas mas também as equipas governativas propostas à votação."
Poderá algum dia esta democracia ser transparente? Não é condição da sua prática oligárquica e anti-democrática, a ausência de transparência? Ou a polícia secreta anda mesmo a caçar terroristas que ainda hoje, por um triz, quase que entraram em nossa casa? E os ministérios, não operam também nesta prática da polícia secreta?
"queremos mandatos revogáveis nos cargos públicos - os representantes são eleitos para cumprirem um programa, pelo que queremos que seja criada uma forma democrática para revogação de mandato em caso de incumprimento do mesmo programa;"
“Uma forma democrática” dentro do sistema que nos indigna...
No hay comentarios:
Publicar un comentario